quarta-feira, 8 de abril de 2015

O que se passa na Amadora não é digno de um Estado de direito ou de uma democracia



Ontem, dia 7 de Abril, no Bairro Estrela de África, novamente a Câmara Municipal da Amadora voltou a mostrar o completo desprezo pela vida e pelos direitos dos seus munícipes. A autarquia demonstra claramente não estar à altura das suas funções. Despejou de forma violenta 17 pessoas, incluindo 5 crianças, e destas apenas uma pessoa tinha solução adequada. Ainda assim, nem a esta senhora, de 74 anos, deram tempo para que fizesse a mudança para a casa que tinha arranjado…. Ela foi, tal como os outros, escorraçada da casa onde vivia há várias décadas. 



A Câmara disse aos jornalistas e às instituições que as casas estavam vazias. Esta é a sua nova estratégia: surpreender tudo e todos, fazer o trabalhinho sujo depressa e depois dizer que as casas estavam vazias, fingindo que desconhece que ali vive gente e há muito tempo.

Ontem, também se dirigiram à casa da Dona Adriana (vídeo em baixo) e disseram-lhe para retirar as coisas da sua casa e ir embora porque viriam hoje. O mesmo não aconteceu, porque sabiam que hoje teriam os olhos dos ativistas, das pessoas solidárias, de deputados municipais e dos jornalistas por perto. Mas é assim que, segundo a autarquia, a próxima vez que forem lá, dirão que a casa da Dona Adriana estava vazia. Mas não. A Dona Adriana não saiu com os seus dois filhos menores e com o seu marido, porque com o rendimento total de 200 euros para a família, não tem para onde ir. Teme no entanto, e muito, pelo que lhe possa acontecer e às suas coisas. Vive ali há anos, e desde há tempos que nunca consegue dormir bem. É o medo, é o clima de terror proporcionado pelas nossas instituições, pelo nosso Estado….

O resultado de mais esta operação é a demolição de casas e a retirada violenta de pessoas, subterrando os próprios pertences das famílias (que não são sequer autorizadas a retirar as coisas), para instituir esse tal clima de terror que fará com que outros abandonem as casas. São 16 pessoas, incluindo 5 crianças, em situação de completa precariedade em termos habitacionais, muito mais grave do que quando viviam naquelas casas. É a ausência completa de respostas pelo Estado social, não assumindo qualquer responsabilidade a que está obrigado. Em vez disso a punição, o ataque a quem muito trabalhou, sempre foi mal pago, e agora está desempregado e sem rendimentos. As pessoas que ontem ficaram na rua improvisam, a partir de agora, formas de se alojarem temporariamente aqui e ali…. Mas ficaram ainda três homens a dormir na rua. Para estes não resta sequer mais nenhum improviso.

O que se passa no concelho da Amadora é um processo violento e sistemático de despejo de milhares de pessoas ao longo dos anos, que ficaram fora do PER – com mais de 20 anos de atraso na sua execução – em vários bairros que outrora tiveram permissão para existir e foram até incentivados. Agora, a violência é o maior perigo para a ordem pública, perpetrada pela máquina camarária e o Estado central, através da polícia e da própria segurança social. Esta não assume que, na verdade, faz atendimentos (que dão legitimidade ao processo) para dizer a estas famílias que não tem nenhuma solução digna desse nome e que, por isso mesmo, nem coloca por escrito.
Como é possível que estejamos calados perante isto? Como é possível que a sociedade não se levante contra esta barbárie e exija a paragem deste processo, a suspensão das demolições até haver alternativas de habitação, no segundo país com mais casas vazias da Europa? Tanto o desenvolvimento de uma política de habitação para todos, como a punição dos pobres e o desrespeito pela vida humana, são escolhas políticas que demonstram o tipo de sociedade em que vivemos e a qualidade dos nossos chamados governantes. Da análise atual não poderemos chamar a isto nem uma democracia nem um Estado de direito.  




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