terça-feira, 10 de maio de 2016

Participação da Habita65 na consulta pública ao HABITAT III- Relatório Nacional para a III conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre habitação e desenvolvimento urbano sustentável

Durante o período de 14 de Março a 12 de Abril esteve aberto à participação pública o relatório nacional relativo à contribuição portuguesa para a terceira conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre habitação e desenvolvimento urbano sustentável que decorrerá em Quito (Equador) em Outubro de 2016. A Habita65 participou, contribuindo com importantes questões não levantadas no relatório, bem como apresentando propostas de intervenção decorrentes da sua experiência e aproximação às questões relativas ao direito à habitação e à cidade.
O relatório base sobre o qual foi feita a participação e disponível a partir de plataforma própria (http://habitatiii.dgterritorio.pt/), coordenado pela Direção-Geral do Território (Ministério do Ambiente), estruturava-se sobre vários domínios temáticos, nos quais a questão do direito à habitação e à cidade emerge de forma mais ou menos direta. Demografia urbana, ordenamento do território e planeamento urbano, ambiente e urbanização, governança urbana e legislação, economia urbana e habitação e infraestruturas básicas eram os seis domínios sobre os quais se debruçava este relatório.
Cada capítulo organizava-se cm base numa série de questões, sendo cada um deles fechado por “questões e desafios futuros a abordar numa Nova Agenda Urbana”, transposta para a plataforma de participação em bloco e com um espaço de participação (bastante) reduzido, limitando assim, as possibilidades apresentadas por um sistema de participação ativa.
Neste contributo, foram levantadas algumas questões nomeadamente ao impacto da alteração ao Regime Jurídico do Arrendamento urbano e número de pessoas desalojadas ao abrigo desta alteração legislativa (Capítulo II - Ordenamento do Território e Planeamento Urbano), ao longo do relatório nunca apresentado como instrumento jurídico acelerador de processos de despejo, mas sempre, e de uma forma unilateral, como potenciador da “renovação socioeconómica especialmente das zonas centrais (Nações Unidas- Habitat III. Relatório nacional- Portugal, 2016, p. 45).
As questões da reabilitação e regeneração urbana, plasmadas no debate acerca do próprio direito à cidade, eram aqui focadas no capítulo IV- Governança urbana e legislação. Promover processos de reabilitação urbana estruturados a partir de medidas de combate à expulsão de residentes, nomeadamente mecanismos de controlo e de apoio ao arrendamento, apoio aos moradores locais, fomento de habitação pública -bolsas de arrendamento e obrigatoriedade de habitação social nos novos licenciamentos de edifícios de habitação plurifamiliar, foram alguns dos contributos apresentados pela Habita65 neste capítulo. De fora ficou uma série de questões relativas à democratização da vida nas cidades, como o próprio acesso transparente à informação e direito à participação efetiva na sua regulação e tomadas de decisão sobre as dimensões urbanas fundamentais para a sua vida, entre estas habitação, espaço público, equipamentos, e transportes.
No capítulo seguinte, “Economia Urbana”, um dos pontos focados era o financiamento da habitação, não se verificando qualquer incidência da análise nas pessoas, nomeadamente no que diz respeito à dimensão de pessoas que perderam a casa para os bancos, nem se quer ao próprio destino e gestão dessas habitações por parte de fundos imobiliários, bancos, etc.
Neste capítulo, e como “questões e desafios futuros a abordar numa Nova Agenda Urbana”, a Habita65 ressalvou a necessidade de olhar particularmente para o número de casas vazias em Portugal e respetivos proprietários, pouco penalizados pela retenção destas habitações e consequente especulação do mercado imobiliário.
Havendo lugar a uma participação mais alargada, mais seria acrescentado enquanto contributo para as questões e desafios futuros: a necessidade de restruturar as dívidas ou as prestações bancárias decorrentes do crédito para habitação, recorrendo, por exemplo, a uma renda social adequada ao rendimento familiar, evolutiva, seria uma das propostas a apresentar neste contexto.
“Habitação e infraestruturas básicas” era o mote do capítulo seguinte. Debruçando-se sobre as políticas e programas de habitação que tiveram lugar a última década do século XX, este capítulo deixou de parte – tal como os próprios programas- uma percentagem grande da população, não fazendo qualquer referência ao número de pessoas que ficaram- e foram sendo postas de parte- no Programa Especial de Realojamento (PER), ou até mesmo às listas de espera para habitação social, quer num contexto de administração central – IHRU- quer, no contexto municipal.
Dos contributos para uma ação futura assinalou-se a necessidade de criar mecanismos prévios a qualquer forma de despejo, garantes de uma avaliação das condições das famílias e das alternativas existentes de forma a salvaguardar a sua dignidade: suspensão de todos os despejos por motivo económicos; a criação de uma estrutura ou programa do Estado que avalie a situação económica e alternativas Processo simultâneo de auditoria aos protocolos e contratos de financiamento PER e PROHABITA, de forma a avaliar e reestruturar os programas de realojamento: novo recenseamento; dotar o PROHABITA da capacidade financeira para realojar de forma permanente (e não temporária) os agregados que ficaram fora do PER.
Desenvolver uma nova lei para o regime de arrendamento apoiado, em diálogo com os moradores, suas associações e comissões de moradores; também desenvolver um plano urgente para as pessoas sem casa com base num censo claro e sério do número de pessoas sem-abrigo, e/ou que vivem em quartos e pensões.
A base de participação da Habita65 foi, não só a análise da realidade a partir do terreno, mas também o documento produzido pela Associação em Janeiro de 2016, base para as audiências com os grupos parlamentares (http://www.habita.info/2016/01/habita-inicia-ronda-de-audiencias-com.html) no mesmo mês. De fora, ficaram muitos contributos que seriam úteis para caracterização e, fundamentalmente, revisão no entendimento atual do próprio direito à habitação e à cidade.

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