Assembleia Municipal de Lisboa, 16-10-2018,
com presença de grupos de moradores (foto Saila Saaristo / Habita)
Com conhecimento a:
Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Vereadores/as da Câmara Municipal de Lisboa
Grupos Municipais da AML
Considerando que:
- O país tem 2 a 3 % de habitação pública;
- Lisboa tem uma percentagem maior, mas também tem uma pressão
demográfica muito maior;
- Lisboa tem milhares de pedidos de habitação social, muitos de
pessoas em situação limite de desespero, que ficam sem resposta
durante anos;
- O número de pessoas sem trabalho, com trabalho precário ou com
salário mínimo aumentou muito nos últimos anos;
- O município de Lisboa (CML) deixou durante muitos anos largas
centenas ou até mais de um milhar de casas municipais vazias e
abandonadas, em degradação permanente;
- A aposta da Câmara, em termos de investimento público ao longo
dos últimos anos, foi para o espaço público no sentido da
valorização imobiliária das zonas da elite, promovendo assim o
gasto de dinheiros públicos para dar ganhos aos privados e
contribuindo para o aumento das rendas e da especulação
imobiliária;
- A CML não se mostra interessada em aumentar o seu parque público
de habitação social, pelo contrário, vendeu muitas casas ao longo
dos últimos anos. Hoje está até a retirar casas do parque social
com renda apoiada para praticar outros preços, mais elevados, por
exemplo um T2 por 500 euros nos concursos de renda condicionada para
a chamada classe média;
- A Câmara está a fazer despejos sem garantir sequer soluções
adequadas para as pessoas. Uma solução adequada não é ir viver na
casa de um familiar onde não há espaço nem boas relações;
- A Câmara de Lisboa tem recebido nos últimos meses vários pedidos
das famílias que se organizaram e que, encontrando-se em situação
dramática, pedem à Câmara diálogo e soluções dignas. A Câmara
recusa o diálogo, não reconhecendo o direito que todos têm de se
associar e organizar;
- Diz a Câmara que ocupar não é solução. Nós perguntamos qual
será então a solução, se não houve resposta ao longo de anos e
anos de concursos de habitação social, se não há resposta no
arrendamento, se não há nenhuma resposta, nenhuma solução à
vista;
- A ocupação não pode ser um assunto de polícia; é um problema
social que decorre da falta de respostas políticas às carências e
às necessidades sociais. Ninguém ocupa com gosto, estando sempre
com receio de ser despejada;
- O sistema de pontuação para atribuição de casa colapsou, quando
há tanta necessidade de habitação e tão pouca resposta;
- A CML recorre à força bruta para despejar famílias e meter nas
casas assim desocupadas outras famílias, com a desculpa de que estas
estariam mais necessitadas; ora, na situação actual não existe
nenhum «complicómetro» capaz de medir o grau de aflição e
urgência em que se encontram centenas, senão milhares, de famílias;
- Quando a CML tira a casa a uns para a entregar a outros, não está
apenas a ter um comportamento irresponsável, desonesto e sem
escrúpulos; está também a provocar deliberadamente os habitantes e
a procurar pôr famílias umas contra as outras; a irresponsabilidade
social destas atitudes camarárias tem de ser apontada, nomeadamente
na pessoa da vereadora responsável pelo pelouro da Habitação;
- Não foram as famílias lisboetas que criaram a crise de habitação
à qual estão sujeitas; essa responsabilidade cabe aos fundos
financeiros, aos bancos, aos especuladores imobiliários, e aos
poderes públicos que apoiam e compactuam com estes especuladores;
apesar disso, a população tem sofrido os horrores desta situação
com paciência e abnegação, não avançando até à data para
formas de protesto radicais como, por exemplo, a greve às rendas;
- Resolver o problema da habitação é simples: regular o mercado,
desenvolver mais habitação pública e parar todos os despejos onde
fique provado que não há alternativa adequada. Contudo, a Câmara
insiste num único tipo de acção: favorecer os interesses
imobiliários e financeiros;
- A continuação dos despejos e a falta de respostas sociais
adequadas favorece discursos xenófobos, racistas e proto-fascistas.
Seja qual for o rumo que esses discursos venham a tomar, a CML não
poderá futuramente eximir-se à sua quota de responsabilidade;
- Habitação é um direito humano. Dada a imensa quantidade de
pessoas sem casa, este problema deixou de ser individual; não é
possível colocar o peso da sua resolução nos ombros das pessoas e
suas famílias. É claramente um problema social, que obriga os
poderes públicos a avançar uma solução acessível, sustentável
(no sentido de desenvolvimento social e urbano equilibrado e mais igualitário, conforme propõe o grupo
de trabalho UN-Habitat, das Nações Unidas), de qualidade e para
todos e todas. Mas a única forma de encontrar soluções adequadas e equitativas, que não morram mais uma vez nas malhas da burocracia,
passa pelo diálogo constante com as associações cívicas dos
moradores.
Perante este estado de coisas, vimos novamente exigir, em nome do
respeito pela dignidade, pela vida humana e pelos direitos
fundamentais, que se parem todos os despejos em que não estão
garantidas alternativas adequadas;
Que seja dada prioridade às pessoas e não aos lucros privados;
Que seja regulado o mercado, parando a especulação e defendendo as
pessoas e os seus direitos;
Vimos exigir mais habitação pública de qualidade.
A solução adequada é, nem mais nem menos, habitação decente para
todas/os!
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